27.05.25 | Brasil 3b4259
Marcelo Muriel fala sobre o trabalho do CIAM junto à população carente da região do Jaguaré 473563
O advogado Marcelo Muriel, presidente do CIAM (Centro Israelita de Apoio Multidisciplinar), fala ao Histórias Reais da CONIB sobre como abraçou o judaísmo e a vida comunitária e se envolveu com o trabalho no CIAM.
O CIAM existe para ser esse instrumento de melhorar o mundo a sua volta, fazer Tikun Olam, que significa ‘reparar o mundo’, um conceito central no judaísmo que enfatiza a responsabilidade individual e coletiva de melhorar o mundo e a sociedade através de ações que visam a justiça social, a paz, a igualdade e a harmonia com a natureza, diz ele.
E o que poucos sabem é que, apesar de ser uma instituição judaica, o CIAM atende a comunidade maior, não judaica, da região do Jaguaré, em São Paulo.
O CIAM foi fundado em 1959. São 66 anos de atividade ininterruptas, com a missão de ajudar crianças, jovens e adolescentes a desenvolver suas potencialidades através de atendimento multidisciplinar e oficinas socioeducativas, visando a sua autonomia e inclusão na sociedade.
Conversão ao judaísmo
A minha família é de origem cristã e eu me converti ao judaísmo há 15 ou 16 anos porque eu sempre fui muito próximo à comunidade judaica. Tinha muitos amigos judeus e sempre frequentei eventos judaicos e chegou um momento em que eu estava me sentindo no limbo, porque eu participava das festas e fazia jejum no Yom Kipur e vi que não fazia sentido eu fazer tudo isso sem ser judeu. Foi então que acabei fazendo todo o processo de conversão. Casei com uma judia e na época em que nos casamos meu sogro era o presidente da sinagoga de Alphaville. E foi assim que eu acabei abraçando o judaísmo e a vida comunitária.
Às vezes as pessoas me perguntam se sou sefaradita ou ashquenazita e eu respondo que sou uma mescla de tudo, porque eu aceito todas as influências, especialmente com relação a alimentos. Minha sogra é marroquina e ela faz comidas maravilhosas da tradição sefaradita, mas tenho amigos ashquenazitas. Aqui em casa sou eu que conduzo, por exemplo, o seder de Pessach, que neste ano reunimos quase 40 pessoas.
Trajetória comunitária
Conheci o trabalho voluntário no CIAM quando fui me casar e eu quis fazer uma doação para uma instituição de caridade, ao invés de ganhar presentes. Foi quando uma amiga me apresentou o CIAM e eu achei o trabalho bacana.
A partir daí eu comecei a me envolver mais com o CIAM, como membro do Conselho. E, como eu não consigo ficar quieto, dei tantos palpites no Conselho que acabei me tornando vice-presidente e depois presidente. E já estou no meu terceiro mandato como presidente do CIAM.
E, por conta de minha atividade no CIAM, eu acabei participando de alguns eventos na Federação Israelita do Estado de São Paulo (Fisesp) e em outras instituições da comunidade.
O Trabalho no CIAM
O CIAM funciona fisicamente no Jaguaré. Lá atendemos a comunidade local, em que a maioria é formada por pessoas em situação de vulnerabilidade social, das classes D e E. Lá não atendemos a comunidade judaica. É uma entidade muito interessante dentro da comunidade judaica, porque todo o nosso trabalho é feito para fora da comunidade.
Outro dia, conversando com o presidente da Câmara, na casa do presidente da Fisesp, eu expliquei como funciona o CIAM, ao contrário do que muitos pensam: que a comunidade judaica trabalha para si mesma. O CIAM é um exemplo típico do trabalho que fazemos para a comunidade maior, como um todo. Entre os nossos atendidos não tem ninguém da comunidade judaica.
Mas o objetivo do CIAM é muito maior do que um simples atendimento. O CIAM tem um trabalho muito maior do que o atendimento aos nossos assistidos, porque ele também funciona como um local para as pessoas que têm a vontade de fazer um trabalho comunitário poderem fazer um trabalho voluntário.
As pessoas podem fazer contribuições e profissionais da comunidade judaica podem prestar um trabalho voluntário, contribuindo com sua experiência para aprimorarmos o atendimento.
O CIAM tem uma repercussão muito maior. Temos, por exemplo, um projeto que consiste na fabricação de cadeirinhas de papelão. O material recebemos da Klabin e nós desenvolvemos toda uma tecnologia de inclinação da cadeirinha para que crianças que não tem tonicidade muscular possam usá-las. Atendemos crianças, jovens e adolescentes com problemas de neurodivergência e incapacidade intelectual e casos de hipotonicidade (redução do tônus muscular). E essa cadeirinha ajuda a manter essas crianças em posição ereta. E eu gosto de citar esse exemplo porque essa cadeirinha tem praticamente um custo zero, porque usamos como materiais, além do papelão que recebemos, cabo de vassoura e aquele macarrão de isopor que as crianças usam nas piscinas. Fazemos a distribuição gratuita dessas cadeirinhas e essa iniciativa tem tido uma repercussão enorme, porque a criança que fica sentada ali vai ter menos complicações respiratórias do que se estiver deitada numa cama. Isso tem uma melhora não só na capacidade respiratória como também na interação com outras pessoas do entorno. Isso também reflete na redução do número de internações dessas crianças.
Então algo que fazemos que tem uma grande repercussão como essa representa também uma economia para o sistema público de saúde. Esse trabalho que fazemos no CIAM é muito interessante também por conta disso.
Sobre antissemitismo
O CIAM por estar no Jaguaré, atender a população maior e não ter em sua sede qualquer referência que o identifique como instituição judaica nunca teve qualquer problema com antissemitismo ou outro tipo de preconceito. Nunca fomos alvo de qualquer manifestação antissemita, ou algo parecido, embora no ano ado tenhamos tido um primeiro incidente nesse contexto. Nós tínhamos feito a divulgação de um show, que normalmente fazemos para arrecadação de fundos, e alguém entrou em uma de nossas redes sociais e fez um comentário muito ruim, dizendo que Hitler não tinha terminado o serviço. Imediatamente contatei a Fisesp, que tomou as medidas necessárias. Essa foi a primeira vez que tivemos um problema desse tipo e pudemos sentir o que é um ataque antissemita.