26.02.25 | Brasil 5q102w
“O 7 de outubro de 2023 despertou nos israelenses um sentimento muito forte de união e irmandade” 602g1i
De Israel, onde vive há 16 anos, a brasileira Marcia Kelner Polisuk, fala ao “Histórias Reais” da CONIB sobre a sua história, sua atuação na comunidade como líder do Hillel-Rio, seu ativismo pela libertação dos reféns em poder do Hamas e sua indignação com os ataques terroristas que chocaram o mundo. “O mundo não entendeu a dimensão do ataque de 7 de outubro de 2023. Aquilo foi um massacre que aconteceu e ainda está acontecendo com reféns ando fome em Gaza, sendo estuprados, torturados e o mundo está calado. Mas a capacidade de resiliência do povo judeu é muito grande e eu diria que esse massacre e o sequestro de reféns despertaram nos israelenses um sentimento de união e irmandade muito forte”.
Desde esse episódio, Márcia vem atuando em manifestações pela libertação dos reféns e para denunciar os abusos que as mulheres vêm sofrendo no cativeiro em Gaza. Também citou o importante trabalho de instituições judaicas, como o Hillel e a Wizo em Israel, em defesa das mulheres israelenses e pela libertação dos reféns.
Origem
Eu me chamo Márcia Kelner, sou psicóloga de formação, sou casada e mãe de dois filhos maravilhosos e venho de uma família muito sionista. Meu pai, Silvio Kelner, fez parte do Conselho Fiscal da CONIB, junto com o pai de Claudio Lottenberg, atual presidente da instituição. Silvio Kelner fez parte também do departamento jurídico da CONIB que foi responsável por estabelecer todo o processo de criação da CONIB como instituição sem fins lucrativos. Por tudo isso, é uma honra para mim ter sido entrevistado pela CONIB.
Vim para Israel com a família há 16 anos. Na ocasião, decidimos não fazer aliá, para experimentar, porque para mim, como judia, sionista e apaixonada que sempre fui pelo país, foi um sonho vivenciar o calendário judaico em Israel - o Rosh Hashaná, o Yom Kipur, Tu Bishvá. E, enquanto jovem, tive a oportunidade de participar de vários programas. Nessa ocasião, eu quis ficar (em Israel), mas minha mãe não deixou. Então, aos 40 anos, decidi que tinha que viver essa experiência.
Então viemos todos para cá e três anos depois fizemos aliá. Não foi fácil decidir ficar porque tínhamos uma vida muito confortável no Rio, com a família e inseridos na comunidade. Mas esse era um sonho e o sionismo falou mais alto.
Atuação no Hillel
Apareceu uma oportunidade de conhecer o Hillel do Uruguai. Na ocasião eu disse: não vou, tenho um filho de três anos e uma filha de 10, além disso aqui tenho o meu trabalho, o trabalho voluntário na escola e minha filha estudou em outra escola. A gente tem uma casa bem pluralista, como o Hillel. Mas nós acabamos indo ao Uruguai e depois eu entendi por que tomei essa decisão. Quando eu ouvi de Bernado Kilchberg que a comunidade que não tem essa pluralidade, não tem esse sionismo e não cuida da sua juventude, de 18 a 30 anos, não vai ter liderança e está fada a minguar. Aí eu entendi por que me levaram para lá. Aí o 'miquinho” ficou aqui no meu ombro e um ano depois abrimos o Hillel no Rio, com o apoio de Edgar Bronfman.
Um ano depois, comuniquei que estava saindo: missão cumprida, a instituição está aí, mas não dá para mim, porque tenho crianças pequenas, meu trabalho. Ai ele me respondeu: Você vai ganhar dez por cento, mas vai ser 90 por cento mais feliz. Vai fazer o que você ama e vai trabalhar para mim. Vou te converter, de doadora (porque sou fundadora do Hillel junto com outros 9 doadores) para profissional. E ele estava certo.
Na época, fui promovida a diretora para a América Latina e depois também no Hillel Internacional e hoje eu também trabalho com o Bordon of goverment do Hillel Internacional. Hoje temos uma liderança extremamente competente para combater o antissemitismo e encarar essa guerra antissemita que acontece nos campi universitários americanos.
A vida diante de conflitos
Em 7 de outubro de 2023 eu estava no Brasil e tenho feito essa ponte aérea Brasil-Israel, porque tenho um pai com 93 anos e, como as crianças cresceram, achamos que dava para manter essa ponte aérea. Então fomos ao Brasil para o aniversário dele de 90 anos quando esse ataque aconteceu. E travei quando vi as notícias, tive síndrome do pânico, algo que eu nunca tinha tido antes. Eu me obriguei a assistir todos os vídeos como educadora não formal, mas ainda educadora, na tentativa de entender o inimaginável.
E estou nessa atuação em Israel, conseguindo fazer o mínimo perto de tudo o que está sendo feito. Isso depois de ter ado um tempo recolhida, porque não conseguia falar sobre tudo que vi e ouvi, como caso de uma moça que foi sequestrada e voltou, a Agam, na primeira leva de reféns libertados. O que ela contou me chocou muito, mas hoje eu consigo falar sobre isso, mas me sinto uma fraca, porque aqui (em Israel) o pessoal seguiu em frente, sem chorar, focado. E eu confesso que travei por um tempo. E eu acho que o mundo não entendeu o tamanho do massacre quando se refere a outubro, 7. E aquilo não foi um simples ataque e, sim, um massacre, que ainda está acontecendo com esses reféns ando fome em Gaza, sendo estuprados, sendo torturados e o mundo está calado. Tenho feito alguns vídeos na Praça (dos Reféns) e fora dela para falar sobre o que estou sentindo como cidadã, como brasileira e israelense. Quando vejo reféns chegando fico feliz e ao mesmo tempo desesperada com a situação dos que continuam em cativeiro.
Foi traumático ver nossos irmãos chegando esquálidos, sem conseguir andar, como sobreviventes de campos de concentração. Nessa ocasião, tinha uma senhora do meu lado, sobrevivente do Holocausto, atuando do Museu do Holocausto da França, e ela me diz: esses eram nossos rostos quando saímos dos campos (de concentração).
Como a guerra mudou a rotina
Não mudou. A única coisa que mudou aqui é um sentimento que é lindo, de irmandade. E esse sentimento de que a guerra desesperada veio num momento em que o povo estava muito revoltado com o que estava acontecendo, como em qualquer país, e ainda está. Mas esse não é momento para discutir isso. Essa união é muito forte. E quando saímos do país, na máquina de registros de aportes do aeroporto, aparecem as fotos dos sequestrados, como um lembrete de que eles não estão entrando, nem saindo, ainda estão lá. Então, sendo turista ou residente você é lembrado disso. Existe uma preocupação muito grande de mostrar isso, que a vida continua, mas que não podemos esquecer dos nossos irmãos que estão nos túneis e de lutar por eles.
Márcia nos deu uma entrevista antes da recente devolução dos corpos de quatro reféns, entre eles o da família Bibas. Mas ela fez questão de postar em suas redes um vídeo feito nas ruas, em Israel, em que diz: “Estamos de luto! O mundo perdeu a oportunidade de fazer a diferença para os judeus. De novo o mundo se calou e virou as costas para nós. A vida desses bebês, o sequestro e o massacre segue com todo mundo em silêncio. Hoje em Israel é um dia histórico, como um dia tenebroso”. Assista: https://www.instagram.com/reel/DGV4ueQocAE/?igsh=MW9mYnMycXBuczU0YQ%3D%3D